COTA É SÓ A GOTA: STF julga constitucionais as cotas raciais em universidades
matéria postada no iG São Paulo | 26/04/2012 10:23:23
- Atualizada às
STF julga constitucionais as cotas raciais em universidades
Por unanimidade, ministros votaram a favor da reserva de vagas para negros no ensino superior
O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou, por unanimidade,
improcedente a ação que questionava o sistema de cotas raciais em
instituições públicas de ensino superior. Dez ministros votaram pela
constitucionalidade das cotas raciais: Ricardo Lewandowski, Luiz Fux,
Rosa Weber, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Gilmar Mendes,
Marco Aurélio, Celso de Mello e o presidente Ayres Britto. O ministro
Dias Toffoli não participa do julgamento porque deu parecer a favor das
cotas quando era advogado-geral da União.
Foto: Agência Brasil
Platéia que assistiu o julgamento do STF sobre cotas para negros
Foram dois dias de julgamento. Na quarta-feira, apenas Ricardo Lewandowski,
relator da ação, concluiu que a política de cotas da Universidade de
Brasília (UnB) é constitucional e julgou “totalmente improcedente” a
ação do partido Democratas (DEM) que a questiona. Após o voto, o
presidente do STF, ministro Ayres Britto, encerrou a sessão que foi
retomada nesta tarde, às 14h30.
Lewandowski afirmou que o Estado pode lançar mão de ações afirmativas
que atingem grupos sociais determinados, de modo a permitir-lhes a
superação de desigualdades históricas. O relator apontou que os
critérios objetivos, “pretensamente isonômicos”, do vestibular quando
empregados de forma linear em sociedades marcadamente desiguais como a
brasileira, acabam por consolidar ou até mesmo acirrar as desigualdades
existentes. Lewandowski também destacou que as ações afirmativas são
temporárias. Entenda as ações e os argumentos dos dois lados
O ministro Luiz Fux abriu o segundo dia do
julgamento e seguiu Lewandowski, votando pela improcedência da ação do
DEM. Fux elogiou o voto do relator e leu uma carta aberta do Centro
Acadêmico da UERJ, que adota o sistema de reserva de vagas há 10 anos.
Os alunos citam que a universidade se tornou um ambiente “mais
democrático, menos desigual e, principalmente, mais brasileiro”. O
ministro também argumentou que opressão racial dos anos da sociedade
escravocrata brasileira deixou cicatrizes no campo da educação. “De
escravos de um senhor, (os negros) passaram a ser escravos de um
sistema”, ressaltou.
Durante a fala de Fux, a sessão deve de ser interrompida para a
retirada de membros da comunidade indígena que protestavam por não
estarem sendo citados no tema das cotas raciais. A fala dos
participantes da tribuna não é permitida durante o voto dos ministros.
A ministra Rosa Weber também considerou a política
de cotas constitucional. Na avaliação da magistrada, a disparidade
racial é flagrante na sociedade brasileira e, como a condição social e
histórica especifica dos negros os afasta das mesmas oportunidades que
os brancos, a intervenção estatal para diminuir essa desigualdade é
valida. “Liberdade e igualdade andam de mãos dadas. Para ser livre é
preciso ser igual, para ser igual é preciso ser livre”, destacou a
ministra.
Cármen Lúcia também seguiu o relator e votou pela
improcedência da ação contra as cotas raciais da UnB. Para a ministra,
as ações afirmativas não são a melhor opção, o ideal seria termos uma
sociedade na qual todos fossem igualmente livres para ser o que
quiserem. Cármen concluiu que as cotas da UnB não colidem com a
constituição, mas ao contrário, contribuem para todos se sentirem
iguais. Joaquim Barbosa, vice-presidente do STF e o único
ministro negro da Corte, também acompanhou o voto do relator. Barbosa
destacou que sua opinião sobre o tema já é de conhecimento público e
inclusive foi objeto de um livro publicado há 11 anos. O ministro
afirmou que as ações afirmativas sofrem resistência, "sobretudo, da
parte daqueles que se beneficiam ou se beneficiaram da discriminação que
são vítimas os grupos minoritários". Ele ressaltou também que o
objetivo das ações afirmativas é combater a discriminação de fato,
arraigada na sociedade, e promover a harmonia e paz social.
O ministro Cezar Peluso iniciou sua fala dizendo que
seria desnecessário acrescentar qualquer consideração ao voto do
relator, e acompanhou integralmente a decisão de Lewandowski. Para
Peluso, as ações afirmativas são um experimento que o Estado brasileiro
está fazendo e que poderá ser verificado e aperfeiçoado.
Gilmar Mendes também julgou improcedente a ação,
mas apontou ressalvas ao modelo da UnB. Ele ressaltou o problema dos
chamados “tribunais raciais”, comissões que julgam se os alunos são
negros ou não e que ocasionalmente cometem erros, como nos casos de
candidatos irmãos que foram classificados com raças diferentes. O
ministro destacou as “enormes dificuldades na classificação” dos
estudantes e as poucas vagas nos cursos, que causam tensão entre os
candidatos – Direito na UnB, por exemplo, tem 50 vagas. Ele apontou em
seu voto que tem muitas dúvidas sobre o critério puramente racial das
cotas, que permite distorções socioeconômicas e pode “gerar perversões”
ao privilegiar pessoas negras ricas que tenham tido boas condições de
estudo.
Marco Aurélio também foi totalmente favorável as
cotas. O ministro recuperou a ideia de igualdade na história das
constituições e falou de como havia diferença entre o direito e a
realidade dos fatos. “Até chegar ao quadro de 1988, havia apenas
formalização da igualdade. Na atual constituição dita cidadã,
sinalizou-se mudança de postura”, disse citando a escolha de uso de
verbos que evidenciava uma tentativa de mudança de postura. Leu os
trechos “construir uma sociedade livre, justa e solidária”, “garantir o
desenvolvimento nacional, não de forma estática, mas ativa” e “Promover o
bem de todos sem preconceito”. Para ele "a neutralidade mostrou-se um
grande fracasso".
Celso de Mello acompanhou integralmente o
relator. "Esse julgamento é sobre um dos mais importantes temas no
Brasil. Traduz o compromisso que o País assumiu ao assinar cartas
internacionais. Extrair a máxima eficácia das declarações em ordem a
tornar possível os ganhos sociais reconhecidos em favor de quaisquer
grupos é dever de todos nós".
O presidente do tribunal, Ayres Britto, falou por último e adiantou o
seu voto com o relator antes mesmo de argumentar. "Quem não sofre
preconceito pela cor da sua pele, não se sente igual, se sente superior.
Nunca houve necessidade de constituição para beneficiar os hegemônicos,
só foi proclamada igualdade para favorecer os desfavorecidos. Os
brancos e heterossexuais nunca precisaram de constituição."
Foto: Agência Brasil
O presidente do STF, ministro Ayres Britto, e o relator da
ação, ministro Ricardo Lewandowski, durante o julgamento das cotas
(25/04)
Apesar da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF)
186, impetrada pelo DEM em 2009, ser específica e questionar a
constitucionalidade do programa que reserva 20% das vagas da UnB para
negros, a decisão do Supremo determinará jurisprudência sobre as cotas e
influenciará futuras decisões do Congresso Nacional sobre leis que
reservam vagas em universidades.
Junto dessa ação, há um recurso feito por um estudante que alega ter
sido prejudicado com o sistema de cotas implementado pela Universidade
Federal do Rio Grande do sul (UFRGS). No Recurso Extraordinário 597.285,
de 2009, ele pede a inconstitucionalidade do sistema.
Leia também: Ministro Joaquim Barbosa é usado como "exemplo negro" em julgamento de cotas
Os argumentos contra e a favor das cotas já foram bastante debatidos
dentro do STF. Em 2010, o ministro relator da ação, Ricardo Lewandowski,
realizou audiências públicas com especialistas em educação, professores
e advogados para tratarem do tema. Primeiro dia
O primeiro dia do julgamento começou com a sustentação oral de
Roberta Fragoso, advogada do DEM, que argumentou que os critérios para a
definição da cor do estudante e que as cotas raciais estimulariam o
racismo ao dividir a sociedade em raças. Roberta citou ainda um estudo
que comprova que mesmo com a aparência negra as pessoas podem ter a
maior porcentagem de sua ancestralidade europeia, como Neguinho da Beija
Flor e a ginasta Dayane dos Santos.
Em seguida, a procuradora federal Indira Quaresma falou pela UnB e
defendeu o sistema de cotas raciais da universidade por ser “reparatório
para corrigir as injustiças do passado”. A procuradora respondeu às
críticas sobre a dificuldade de definir a raça de uma pessoa em uma
sociedade miscigenada afirmando que “os olhares brasileiros identificam
os negros em qualquer ambiente” e que as ciências naturais não são
superiores às ciências sociais.
Pela Advocacia Geral da União, falou Luis Inácio Lucena Adams, que
declarou improcedente a ação do DEM e defendeu as políticas de ação
afirmativa do governo federal. Adams destacou que o Brasil sempre
participou do compromisso de promover uma sociedade racialmente mais
igualitária, mas que não realizou ações suficientes para tal. O
advogado-geral da União apontou ainda que o Brasil precisa enfrentar
este desafio para ser um país de primeiro mundo.
Em seguida, falaram amigos da corte, representantes de movimentos
sociais que deram sua opinião para auxiliar os magistrados a chegar a
uma decisão. A primeira parte do julgamento foi finalizada pela
vice-procuradora geral da República, Déborah Duprah, que falou pelo
Ministério Público Federal. Ela também pediu à corte a improcedência da
ação e criticou o argumento de que as cotas deveriam ser somente para
estudantes pobres, lembrando que há políticas de cotas para mulheres e
para deficientes físicos sem o recorte social. “Por que essa questão
(social) só aparece nas cotas raciais?”, provocou. Prouni
Outra ação que estava na agenda do SFT para ser analisaria a partir
de quarta-feira é o programa do governo federal que dá bolsas a jovens
de baixa renda em instituições privadas de ensino. A Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) impetrada pela Confederação Nacional dos
Estabelecimentos de Ensino (Confenen) contra o programa alega que as
instituições filantrópicas, por determinação da Constituição Federal,
não pagam impostos. Com as exigências do Ministério da Educação (MEC)
para a oferta de números mínimos de bolsas por elas, a entidade acredita
que a lei de criação do Prouni fere a constituição.
GOTA DO QUE NÃO SE ESGOTA Cuti (Luiz Silva)
cota é só a gota a derramar o copo não a mágoa do corpo mas energia represada que agora se permite e voa em secular esforço de superar-se coisa e se fazer pessoa
cota é só a gota apenas nota de longa pauta a ser tocada com o fino arco em mãos calosas
cota é só a gota a explodir o espanto de se enxugar no riso a imensidão do pranto
ela é só a gota ruindo pela base a torre de narciso
é só a gota entusiasmo na rota afirmativa que ameniza as dores da saga suas chagas de desigualdade amarga
cota é só a gota meta de quem pagou e paga desmedido preço de viver imposto e agora exige seu direito a voto na partição do bolo
é só a gota de um mar de dívidas contraídas pelos que sempre tornaram gorda a sua cota
cota é só a gota afrouxando botas de um exército para o exercício da eqüidade
cota não reforça derrota equilibra entre ponto de partida e ponto de chegada a vitória coletiva reinventada. ( in: Negroesia, p.73)
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